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Mesmo após Dom Pedro I proclamar a Independência do Brasil às margens do Rio Ipiranga, em São Paulo, em 7 de setembro de 1822, o país não ficou livre do domínio português e passou por uma série de conflitos. Um dos mais decisivos para a perda definitiva do governo lusitano foi a Batalha de Pirajá, ocorrida em Salvador apenas dois meses depois do famoso brado do príncipe regente.

“Foi a maior batalha em número de participantes pela Independência do Brasil. Por isso que Pirajá guarda toda essa importância simbólica, sendo um dos principais palcos da guerra. Ela ocorreu em 8 de novembro de 1822, e não em 2 de julho de 1823, como muitos pensam. A Bahia, simbolicamente, nasceu ali. Antes disso, éramos colônia, extensão de Portugal ”, explica o professor e historiador Murilo Mello.

Até o desencadear desta luta armada, que durou cerca de oito horas, diversos embates militares e políticos acenderam os ânimos entre os que buscavam a independência e apoiadores da causa lusitana.

As primeiras faíscas tiveram início quando o Brasil passou a ter status de reino unido, a partir de 1815, com Dom João VI exercendo governo fora de Portugal. A grande contradição, entretanto, era que o novo reino tinha dois centros políticos: Lisboa, capital portuguesa, e Rio de Janeiro, à época capital brasileira, onde estava o príncipe regente.

A situação se arrastaria ainda por mais alguns anos quando eclodiu a Revolução do Porto, em 1820. Naquela ocasião, rebeldes portugueses queriam tirar medidas de liberdade ao Brasil que Dom João adotou quando chegou ao país em 1808. “Era uma revolução liberal para com Portugal e que visava formação de uma monarquia constitucional, mas extremamente conservadora para com o Brasil”, define Murilo.

Pressionado pelas cortes portuguesas, Dom João VI, que àquela altura já havia sido proclamado rei após a morte da rainha-mãe, Maria I, retornou à Europa, em 1821, deixando o filho Dom Pedro I como o príncipe regente no Brasil. Na volta ao Velho Continente, o monarca baixou decreto subordinando as províncias brasileiras a Lisboa. Outro evento que viria ajudar a acender o pavio foi a nomeação de dois diferentes nomes ao posto de Comandante das Armas.

Em terras brasileiras, Dom Pedro deu o cargo ao tenente-coronel Manoel Pedro de Freitas Guimarães, enquanto que Dom João VI pôs o brigadeiro Inácio Luís Madeira de Melo para a função. Um acordo chegou a ser oferecido para a formação de uma junta militar, o que não houve sucesso.

Com a dualidade de comando, as tropas lusitanas de Madeira de Melo e as tropas brasileiras (compostas por militares regulares e milícias) entraram em choque. No início de fevereiro de 1822, os soldados a mando de Portugal invadiram o Forte de São Pedro e quartéis em Salvador, buscando apreender armas, munições, soldados e oficiais amotinados.

Os portugueses também adentraram ao Convento da Lapa, onde acreditavam haver soldados brasileiros escondidos. Durante a invasão feriram mortalmente a golpes de baioneta a abadessa sóror Joana Angélica, que tentou impedir que os homens invadissem o recinto religioso feminino. A partir desse momento, o estado de ânimo ficou irreconciliável e a situação só viria a ser resolvida pelas armas nos campos de batalha.

Cerco montado - É aí que surge um dos nomes mais importantes na luta pela Independência do Brasil na Bahia: Joaquim D’Ávila Pereira, o coronel Santinho. Descendente da Casa da Torre, do Castelo Garcia d’Ávila (em Praia do Forte, litoral norte do estado), ele vai iniciar uma contraofensiva diante do que Portugal estava fazendo.

Santinho foi o primeiro baiano que efetivamente mobilizou um batalhão de nacionais, formado por indígenas armados com arcos e flechas, com experiência na preparação de emboscadas. Em 18 de julho de 1822, o coronel acampou em Pirajá, bloqueando a Estrada das Boiadas. Esta via ligava o sertão a Salvador, sendo utilizada para transportar o gado que vinha da Feira de Capuame - atual município de Dias D’Ávila - para a capital baiana. Também era essencial acesso para chegada de suprimentos vindos do Recôncavo.

Na Estrada das Boiadas, aproximadamente na altura de Pirajá, foram organizadas operações de guerrilha e montado cerco contra as forças portuguesas. “Era uma estratégia perfeita. Sem a chegada de alimentos à capital, Portugal não conseguiria ficar muito tempo”, avalia Murilo Mello.

O bloqueio se intensificou de tal forma que os preços dos alimentos disparam e a fome assolou a capital. De acordo com o jornalista e escritor Laurentino Gomes no livro 1822, uma galinha viva, avaliada em 880 réis no Rio, era vendida por 4,8 mil réis em Salvador. “Nossas privações vão crescendo porque não entra para a cidade gênero algum de primeira necessidade”, reclamava o general Madeira de Melo em carta a D. João VI.

Organização - A Batalha de Pirajá foi fundamental porque Portugal tinha que furar aquele cerco para conseguir comida, sendo ainda símbolo de resistência das tropas que lutavam pela independência.

Pouco antes dela acontecer, em 8 de novembro de 1822, os batalhões patrióticos não possuíam organização formal e nem ações coordenadas. Neste cenário, Dom Pedro I, que já era dissidente da Coroa, resolve trazer mercenários para organizar a defesa. Foram contratados a peso de ouro o general francês Pierre Labatut e o almirante escocês Thomas Cochrane, ambos com experiências e lutas na Europa.

No momento em que assumiu as tropas, Labatut encontrou um exército de voluntários composto por indígenas, negros e mestiços escravos, livres e libertos, mesclando soldados regulares e voluntários. Antes de desembarcar na capital baiana, ele arregimentou homens do Rio de Janeiro e Pernambuco para compor suas tropas, engrossando o caldo dos batalhões libertadores.

O lendário corneteiro - O conflito entre os exércitos português e brasileiro ocorridos em Pirajá abrangeu não apenas onde é hoje o bairro como as localidades de Cabrito e Campinas. Com mata atlântica densa e poucas construções à época, Pirajá era um lugar que tinha peixe em abundância, rios e fonte de água importante para Salvador. O atual Parque São Bartolomeu, inclusive, foi um dos palcos da guerra.

Com apenas quatro horas de combate, a vitória lusitana na Batalha de Pirajá era dada como certa. Não há consenso quanto ao número de combatentes em campo. Há fontes que citam a participação de cerca de 4 mil soldados, sendo pouco mais da metade de portugueses (ou seja, a maioria) e o restante por brasileiros.

Ao perceber uma eventual derrota durante o conflito, o tenente-coronel Barros Falcão, comandante do batalhão libertador em Pirajá, ordenou o recuo das forças nacionais. É neste momento que surge mais um dos personagens lendários na luta pela Independência do Brasil na Bahia: o corneteiro Luís Lopes.

Lopes teria recebido de Barros Falcão a ordem de soar o toque de retirada, mas não se sabe se por engano ou de propósito, soou o “avançar cavalaria”, o que teria feito os portugueses fugirem, assustados com a perspectiva da chegada de um regimento de cavalaria brasileiro que não existia. Essa façanha não possui comprovação histórica fundamentada.

Assustadas, imaginando que os brasileiros haviam recebido reforços, as tropas lusitanas partiram em retirada em direção a Lapinha, sendo perseguidas pelos soldados do exército libertador que estavam armados com baionetas e sabres.

A vitória na Batalha de Pirajá, contudo, não se resume a um golpe de sorte. Trata-se do resultado do esforço patriótico de soldados e voluntários que se engajaram na luta contra um exército mais numeroso e bem melhor treinado e equipado. A derrota dos portugueses no conflito assegurou o posicionamento das tropas brasileiras na região e a continuidade do cerco a Salvador.

Reportagem: Thiago Souza / Secom PMS

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